O tema é pesado, complexo e controverso, porém, necessária se faz a sua discussão.

A prática da advocacia criminal em suas várias ramificações é uma prática não muito compreendida pela sociedade e, também, por alguns profissionais (advogado(a)s) que não militam na área, o que a torna uma atividade única e muito, mas muito importante para a administração e aplicação da justiça.

Ressalta-se, oportunamente, que a profissão de advogado é tão importante que possui previsão expressa na Constituição Federal, conforme preconiza o art. 133:

O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.

 Questão tormentosa e que causa repulsa em muitas pessoas é o fato de “alguém” defender um acusado de crime sexual. Sim, é verdade que qualquer crime sexual é um ato nefasto, entretanto, a lei quando confere ao advogado(a) a capacidade postulatória de defender qualquer pessoa não faz distinção sobre quais atos são ou não passíveis de defesa.

O juízo de valor sobre a causa quando aceita por um(a) advogado(a) não deve, nunca, existir, pois, somente assim ele(a) conseguirá realizar um trabalho de excelência dentro do que a lei lhe permite fazer.

O Código de Ética e Disciplina da OAB em seu art. 23 estabelece que:

Art. 23. É direito e dever do advogado assumir a defesa criminal, sem considerar sua própria opinião sobre a culpa do acusado. Parágrafo único. Não há causa criminal indigna de defesa, cumprindo ao advogado agir, como defensor, no sentido de que a todos seja concedido tratamento condizente com a dignidade da pessoa humana, sob a égide das garantias constitucionais.

 Obviamente que existem profissionais que não se sentem confortáveis para atuar na defesa de uma pessoa acusada de crime sexual e não há nada demais nisso, desde que não aceitem o caso. Quando um(a) advogado(a) aceita um caso dessa natureza o seu dever é fazer o melhor para seu cliente, ainda que todos o(a) julguem como se ele fizesse parte daquilo que, legalmente, está defendendo. Dessa forma, não há de se confundir os atos do advogado criminalista com aqueles praticados pelo seu cliente.

Advogar na área criminal não é ser indigno, muito pelo contrário. Advogar na área criminal é exteriorizar a verdadeira função do princípio da isonomia, ou seja, tratar a todos como se únicos fossem, independentemente de suas desigualdades sociais, financeiras, morais, culturais, ideológicas, entre outras.

Assim sendo, não há de se estabelecer qualquer conceito negativo para um advogado que cumpre o seu papel da forma que bem entende, ainda que este papel não seja, aos olhos de muitos, o mais “normal” a exercer.

Certamente que se a pessoa cometeu um crime, no caso aqui em comento um crime sexual, ela deve pagar, porém, dentro dos limites da lei. Não estamos aqui pregando a santidade para criminosos sexuais, longe disso, entretanto, também não podemos incitar qualquer penalidade extra legem.

Cabe ao advogado criminalista, quando atuar na defesa de um criminoso sexual que realmente praticara o ato, não medir esforços para que os direitos do seu cliente sejam todos resguardados, sejam eles de ordem pessoal ou processual. Nenhum crime que a pessoa comete retira dela os seus direitos garantidos pelo ordenamento jurídico. Não se combate um crime com outro crime, mas sim com a aplicação da lei.

Outra questão que deve ser muito bem refletida é a acusação de um crime sexual quando este não acontece. Diuturnamente surgem situações falsas de crimes sexuais, principalmente estupro e estupro de vulnerável, onde, os acusados de pronto são taxados de estupradores com base somente em uma imputação, muitas vezes, solitária e vazia.

Quando isso ocorre o pior julgamento que pode ocorrer é o social. Este não respeita nenhuma garantia legal e – se analisarmos de forma fria a situação – percebemos que o julgamento social nada mais é do que uma ditadura moral que vive dentro de cada um de nós, o que é temerário.

Já vivenciamos ao longo dos anos casos de falsas acusações (de diversas ordens) que levaram ao extremo os seus desfechos, vide, por exemplo, “a bruxa do litoral” e “o caso da Escola B.A.S.E”.

Há de se ter cautela quando diante de um crime sexual para que injustiças não sejam feitas e, principalmente, que a justiça seja feita, ainda que o conceito de justiça que habita em cada um de nós seja diferente.

Quem advoga atuando em crimes sexuais certamente já se deparou com perguntas como: “e se fosse sua filha?”; “e se fosse sua mãe?”; “e se fosse alguém da sua família?”; “você fala isso porque não é com ninguém que você ama”.

Compreensíveis as indagações acima, porém, as mesmas pessoas que fazem tais indagações, também deveriam refletir nas possíveis respostas das perguntas que aqui fazemos: “e se fosse o seu filho o acusado?”; “e se fosse o seu filho o acusado falsamente?”; “e se fosse o seu pai, marido, ou alguém que você ama o acusado (de fato ou falsamente)?”; “e se a colega de sala do seu filho o acusasse?”. Será que os valores morais e sociais mudariam?

Fica a reflexão!